A Páscoa ” Getsêmani ” – Charles H. Spurgeon

Poucos foram feitos participantes das aflições do Getsêmani. A maioria dos discípulos não estava lá. Eles não eram suficientemente maduros na graça para serem capazes de contemplar os mistérios “da agonia”.

Ocupados com a festa de Páscoa em suas casas, eles representavam os muitos que viviam sob a lei, mas eram meros bebês e lactantes no que se refere ao espírito do Evangelho. Os muros do Getsêmani apropriadamente tipificam esta fraqueza na graça que efetivamente esconde da contemplação dos crentes simples as profundas maravilhas da comunhão. A doze, ou melhor, a onze [discípulos] foi concedido o privilégio de entrar no Getsêmani e contemplar esta grandiosa visão.

Dos onze, oito foram deixados a certa distância; eles tinham comunhão, mas não aquele tipo de intimidade a que são admitidos os homens grandemente amados. Apenas três altamente favorecidos, que tiveram com Ele no monte da transfiguração, e testemunharam o milagre da ressurreição na casa de Jairo – apenas estes três puderam aproximar-se ao véu de Sua misteriosa angústia: neste véu mesmo estes não deveriam adentrar; uma distância de um tiro de pedra deveria estar entre eles. Ele deveria pisar o lagar sozinho, e do povo ninguém deveria estar com Ele.

Pedro e os dois filhos de Zebedeu, representam os poucos santos eminentes, experimentados, instruídos na graça, que podem ser descritos como “Pais” estes fizeram negócios em muitas águas, podem em algum grau, mensurar a enorme onda Atlântica da paixão do seu Redentor; havendo passado muito tempo sozinhos com Ele, eles podem ler Seu coração bem melhor do que aqueles que meramente O viram em meio à multidão.

A alguns espíritos escolhidos isto é dado, para o bem de outros, e para seu próprio fortalecimento para [enfrentar] algum conflito futuro, especial e tremendo, para adentrar no círculo íntimo e ouvir as súplicas do sofrimento do Sumo Sacerdote; eles têm comunhão com Ele em Seus sofrimentos, e são feitos semelhantes à Sua morte.

Contudo, eu digo, mesmo estes, os eleitos dentre os eleitos, estes escolhidos e favoritos especiais dentre os cortesãos do rei, mesmo estes não podem adentrar no lugar secreto do sofrimento do Salvador, como para compreender todas as Suas agonias. “Teus desconhecidos sofrimentos” é a notável expressão da Liturgia Grega; pois há uma câmara interna em Sua aflição, isolada do conhecimento e companheirismo humanos. Não foi aqui que Cristo foi mais do que nunca um “Indescritível presente” para nós? Acaso não está certo Watts quando canta –

“E todos os júbilos desconhecidos que Ele proporciona Foram comprados com agonias desconhecidas.”

Uma vez que não seja possível para nenhum crente, por mais experimentado que seja, saber por ele mesmo tudo o que nosso Senhor suportou no lugar de prensa de azeite, quando Ele foi esmagado sob a mais alta e mais baixa pedra do moinho do sofrimento mental e malícia infernal, isto é claramente muito além da capacidade do pregador em expressá-lo a vocês. O próprio Jesus deve dar-lhes acesso às maravilhas do Getsêmani: quanto a mim, posso apenas convidá-los a entrar no jardim, pedindo a vocês que tirem as sandálias dos pés, porque o lugar em que estamos é terra santa.

Eu não sou Pedro, nem Tiago, nem João, mas alguém que, de bom grado, como eles, gostaria de beber do cálice do Mestre, e ser batizado com o Seu batismo. Eu tenho até agora avançado apenas tão longe quanto está o grupo de oito [discípulos], mas ali eu tenho escutado os gemidos profundos do Homem de dores. Alguns de vocês, meus veneráveis amigos, devem ter aprendido bem mais do que eu; mas vocês não se recusarão a ouvir novamente o ruído das muitas águas que se esforçaram para [tentar] apagar o Amor do Grandioso Esposo das nossas almas [Ezequiel 1:24].

Muitos assuntos exigirão nossa breve consideração. Vem Espírito Santo, Sopra luz em nossos pensamentos, vida em nossas palavras.

I. Venham mais perto e contemplem a INEXPRIMÍVEL AFLIÇÃO DO SALVADOR.

As emoções daquela dolorosa noite são expressas através de muitas palavras na Escritura. João O descreve como dizendo quatro dias antes da Sua Paixão, “Agora está minha alma perturbada” enquanto advertia sobre o ajuntamento de nuvens Ele quase não sabia onde entregar-se e clamou “E que direi eu?” [João 12: 27]. Mateus escreveu sobre Ele, “ele começou a entristecer-se e a angustiar-se muito”. [Mateus 26:37].

Sobre a palavra ademonein traduzida como “angustiar-se muito”, Goodwin comenta que havia uma desorientação na agonia do Salvador, pois em sua origem a palavra significa “separado do povo – homens confusos, tornando-se separados da humanidade”. Que pensamento, meus irmãos, que nosso Bendito Senhor tenha sido levado ao limite máximo da desorientação pela intensidade de Sua angústia. Mateus apresenta o próprio Salvador dizendo “A minha alma está cheia de tristeza, até a morte”. [Mateus 26:38]. Aqui a palavra Perilupos significa envolvido, cercado, sobrecarregado de dor. “Ele foi submergido completamente (até a cabeça e orelhas) em sofrimento e não tinha como desafogar-se,” é a forte expressão de Goodwin.

O pecado não deixa nenhuma brecha pela qual possa entrar o consolo, e, portanto, quem carrega o pecado deve estar inteiramente imerso em dor. Marcos registra que Ele começou a ter pavor, e a angustiar-se [Marcos 14:33]. Neste caso thambeisthai, com o prefixo ek, demonstra assombro ao extremo, como aquele de Moisés quando sentiu grande temor e tremor. Ó bendito Salvador, como nós podemos suportar pensar em Ti como um homem assombrado e temeroso! Todavia, foi assim quando os terrores de Deus se dispuseram em batalha contra Ti.

Lucas usou a forte linguagem do meu texto – “e posto em agonia”. [Lucas 22:44]. Estas expressões, as quais cada uma é digna de ser tema de um sermão, são quase suficientes para expressar que a aflição do Salvador era de um caráter sumamente extraordinário justificando bem a exclamação profética “Atendei, e vede, se há dor como a minha dor, que veio sobre mim”. [Lamentações 1:12]. Ele permaneceu ante a nós em miséria incomparável. Ninguém foi tão afligido pelos poderes das trevas quanto Ele; é como se os poderes do inferno tivessem dado o comando às suas legiões: “Não pelejem nem contra pequenos nem contra grandes, mas somente contra o próprio Rei de Israel”.

Se professássemos compreender todas as causas das agonias de nosso Senhor, a sabedoria nos repreenderia com o questionamento “Entraste tu até as origens do mar, ou passeaste no mais profundo do abismo?” [Jó 38:16]. Não podemos fazer mais do que olhar as causas reveladas do sofrimento. Surgiu, em parte, do horror de sua alma quando compreendeu plenamente o significado do pecado. Irmãos, quando vocês foram primeiramente convencidos do pecado e o viram como algo extremamente pecaminoso, embora sua compreensão de pecaminosidade fosse apenas débil comparada com sua real atrocidade, ainda assim o terror apoderou-se de vocês. Lembram-se daquelas noites de insônia? Como o salmista, você disse: “envelheceram os meus ossos pelo meu bramido em todo o dia.

Porque de dia e de noite a tua mão pesava sobre mim; o meu humor se tornou em sequidão de estio” [Salmos 32:3-4]. Alguns de nós podem se lembrar de quando nossas almas escolheriam antes a estrangulação do que a vida [Jó 7:15], quando se as sombras da morte nos tivessem escondido da Ira de Deus nós ficaríamos muito felizes em dormir na sepultura para não fazer nossa cama no inferno [Salmos 139:8]. Nosso bendito Senhor viu o pecado em sua escuridão natural.

Ele teve a mais nítida percepção do traiçoeiro assalto sobre seu Deus, de Seu ódio homicida contra sua própria pessoa, e influência destruidora do pecado sobre a humanidade. Seria esperado que o terror se apoderasse dEle, pois uma visão do pecado deve ser de longe mais aterrorizante do que uma visão do inferno, o qual é apenas a sua prole.

Outra profunda fonte de dor é encontrada no fato de que Cristo agora assumiu mais plenamente Sua posição oficial em relação ao pecado. Ele agora foi feito pecado. Ouça a palavra! Ele, que não conheceu o pecado, foi feito pecado por nós, para que fôssemos feitos justiça de Deus nEle. Naquela noite as palavras de Isaías foram cumpridas – “O SENHOR fez cair sobre ele a iniquidade de nós todos”. [Isaías 53:6]. Agora Ele ficou como quem leva o pecado, o substituto aceito pela Justiça Divina para suportar a plenitude da ira Divina a qual nós nunca poderíamos suportar.

Naquela hora o céu olhou para Ele como estando no lugar do pecador, e tratou-Lhe como um homem pecador merecia ser amplamente tratado. Ó, queridos amigos, quando o imaculado Cordeiro de Deus percebeu a Si mesmo no lugar do culpado, quando Ele não podia recusar tal lugar porque Ele tinha aceitado isto voluntariamente de modo a salvar os Seus escolhidos, o que deve ter sentido a Sua alma, como Sua natureza perfeita deve ter sido escandalizada com tão estreita associação com a iniquidade?

Nós acreditamos que neste momento, nosso Senhor teve uma nítida visão de toda a vergonha e sofrimento de Sua crucificação. A agonia foi apenas uma das primeiras gotas do tremendo aguaceiro que foi descarregado sobre a Sua cabeça. Ele previu a chegada apressada do discípulo traidor, a captura pelos soldados, juízos simulados ante ao Sinédrio, Pilatos e Herodes, os açoites e golpes, a coroa de espinhos, a vergonha, a cuspida.

Tudo isto veio a Sua mente, e, como está é uma lei geral de nossa natureza, que a visão antecipada de julgamento é mais penosa do que o julgamento em si, podemos conceber como foi que Ele que não respondeu nenhuma só palavra quando em meio ao conflito, não pôde conter a si mesmo de intenso choro e lágrimas na expectativa do julgamento. Amados amigos, se vocês pudessem reviver ante o olho de suas mentes os terríveis incidentes de Sua morte a perseguição pelas ruas de Jerusalém, a crucificação, a febre, a sede, e, acima de tudo, o desamparo do Seu Deus, vocês não poderiam surpreender-se que Ele começou a angustiar-se, e ficou muito entristecido.

Mas possivelmente uma raiz de amargura ainda mais frutífera era esta – que agora o Seu Pai começara a retirar a Sua presença dEle. A sombra deste grande eclipse começou a cair sobre Seu espírito quando Ele ajoelhou-se naquela fria meia-noite entre as olivas do Getsêmani. O sensível consolo que alegrava o Seu espírito foi retirado; A bendita aplicação da promessa que Cristo Jesus necessitava como homem foi removida, tudo o que entendemos pelo termo “consolações de Deus” foi ocultado de Seus olhos. Ele foi deixado sozinho em Sua fraqueza para lutar pela libertação do homem. O SENHOR permaneceu como se fosse um espectador indiferente, ou melhor, como se fosse um adversário, Ele O feriu “com ferida de inimigo, e com castigo de quem é cruel”.

Tentações de Satanás.

Esta hora, mais do que em qualquer outro momento de Sua vida, ainda mais do que o conflito de quarenta dias no deserto, foi o momento de Sua tentação. “Esta é a vossa hora e o poder das trevas”. Agora Ele poderia dizer enfaticamente, “vem o príncipe deste mundo”. Este foi o Seu último combate corpo a corpo contra todas as hostes do inferno, e aqui Ele deveria suar grandes gotas de sangue antes que a vitória pudesse ser alcançada.

Nós temos um vislumbre das fontes do grande abismo que foram quebradas quando as águas da aflição inundaram a alma do Redentor. Irmãos, [vejamos] esta lição antes de nós deixarmos a contemplação. “Porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém, um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado. Cheguemos, pois, com confiança ao trono da graça, para que possamos alcançar misericórdia e achar graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno”. [Hebreus 4: 15-16].

Pensemos que nenhum sofrimento pode ser desconhecido para Ele. Nós apenas corremos com homens que vão a pé – ele teve que contender com cavaleiros; nós apenas passamos até os tornozelos pelos rasos córregos do sofrimento – Ele teve que dar braçadas contra as enchentes do Jordão [Jeremias 12:5]. Ele nunca falhará em socorrer Seu povo quando tentado; tal como se disse na antiguidade, “Em toda a angústia deles Ele foi angustiado, e o anjo da Sua presença os salvou” [Isaías 63:9].

II. Continuemos a contemplar A TENTAÇÃO DE NOSSO SENHOR.

Ao início de Sua carreira, a serpente começou a mordiscar o calcanhar do prometido libertador; e agora, conforme se aproximava o tempo no qual a semente da mulher esmagaria a cabeça da serpente, este antigo dragão realizou um ataque desesperado contra o seu grande destruidor. Não é possível a nós que ergamos o véu onde a revelação tem permitido que este oculte, mas nós podemos fazer alguma ideia das sugestões com as quais Satanás tentou nosso Senhor.

Vamos, contudo, assinalar de forma cautelosa, antes de nós tentarmos pintar este quadro, que independentemente do que Satanás possa ter sugerido ao nosso Senhor, Sua natureza perfeita, em nenhum nível, de nenhuma forma, submeteu-se a isso e ao pecado. As tentações foram, sem dúvidas, da natureza mais abominável, mas estas não deixaram nenhuma mancha ou imperfeição sobre Ele, que permaneceu sendo o primeiro entre dez mil [Cantares de Salomão 5:10]. O príncipe deste mundo veio, mas ele não teve nada em Cristo. Ele gerou as faíscas, mas estas não caíram, como em nosso caso, sobre palha seca; elas caíram como no oceano, e foram apagadas de imediato. Ele lançou as flechas de fogo, mas estas não puderem sequer deixar cicatriz na carne de Cristo; estas acertaram sobre o escudo de Sua natureza perfeitamente justa, e caíram com as suas pontas quebradas, para a frustração do adversário.

Mas, pensem vocês, que foram estas tentações? Parece-me, a partir de algumas pistas disponíveis, que elas foram mais ou menos assim – havia primeiro, uma tentação para deixar o trabalho inacabado; podemos inferir isto a partir da oração – “se é possível, passe de mim este cálice”. “Filho de Deus,” o tentador disse, “é isto então? Foste Tu realmente chamado para carregar o pecado do homem? Disse Deus, “Pus o socorro sobre um que é poderoso” [Salmos 89:19].

E és Tu, o eleito de Deus, para carregar toda esta carga? Olhe Tua fraqueza! Estás suando, mesmo agora, grandes gotas de sangue; Certamente Tu não és Aquele a quem o Pai tem ordenado a ser poderoso para salvar; ou se Tu fores, o que ganharias por isto? De que isto Te servirá? Tu já tens glória suficiente. Olhe quão miseráveis são aqueles pelos quais Tu ofereces a ti mesmo como um sacrifício; Teu tesoureiro, Judas, apressa-se pra trair-Te pelo preço de um escravo comum. O mundo pelo qual Tu sacrificas a Ti mesmo descartará o Teu nome como algo maligno, e a Tua Igreja, pela qual Tu pagas o preço de resgate, do que ela é merecedora?

Uma multidão de mortais! Tua divindade poderia criar seres semelhantes a qualquer momento em que Te aprouver; então, por que precisarias Tu, derramar Tua alma até a morte?”. Tais argumentos poderiam ter sido usados por Satanás; a astúcia infernal de um que tem estado tentando os homens por milhares de anos, saberia como inventar todos os tipos de maldades. Ele derramaria as mais ardentes brasas do inferno sobre o Salvador. Foi lutando contra esta tentação, dentre outras, que, estando em agonia, nosso Senhor orou mais intensamente.

A Escritura indica que nosso Senhor foi [de tal forma] assaltado pelo medo que Suas forças não teriam sido suficientes. Ele foi ouvido no que Ele temia. Como, então, Ele foi ouvido? Um anjo foi-Lhe enviado para fortalecê-lO. Seu temor, então, foi, provavelmente, produzido por um senso de fraqueza. Eu imagino que o vil demônio teria sussurado em seu ouvido – “Tu! Tu toleras ser castigado por Deus e ser aborrecido pelos homens! Opróbrio já tem ferido teu coração; Como Tu suportarás ser envergonhado publicamente e levado para fora da cidade como coisa imunda? Como Tu suportarás ver Teus parentes chorosos e Tua mãe de coração partido aos pés da Tua cruz?

Teu espírito afetuoso e sensível será intimidado sob isto. Enquanto Teu corpo, já está enfraquecido; Teus longos jejuns já Te têm debilitado; Tu Te tornarás uma presa para a morte bem antes que Teu trabalho seja cumprido. Tu certamente falharás. Deus tem Te desamparado. Agora eles perseguirão e prenderão a Ti; eles entregarão Tua alma ao leão, e Tua vida ao poder do cão”. Então, ele poderia retratar todos os sofrimentos da crucificação, e dizer, “Pode suportar o Teu coração, ou podem Tuas mãos serem fortes no dia em que o Senhor procederá contra Ti?”

A tentação de Satanás não foi dirigida contra a Divindade, mas contra a humanidade de Cristo, e, portanto, o maligno provavelmente se concentraria na fraqueza do homem. “Tu mesmo não disseste, ‘Mas eu sou verme, e não homem, opróbrio dos homens e desprezado do povo?’ [Salmo 22:6]. Como Tu irás suportar quando as nuvens da Ira de Deus se ajuntarem sobre Ti? A tempestade certamente fará naufragar todas as tuas esperanças. Não pode ser; Tu não podes beber deste cálice, nem ser batizado com este batismo”. Desta maneira, imagina- mos, nosso Mestre foi tentado.

Mas vejam, Ele não se rende a isto. Estando em agonia, palavra esta que significa em um ringue de luta, Ele peleja com o tentador como Jacó com o anjo. “Não,” disse Ele, “Eu não serei subjugado pelas provocações dirigidas à minha fraqueza; eu sou forte na força da minha Divindade, eu ainda irei vencer-Te”. Contudo, a tentação foi tão terrível, que para dominá-la, Sua depressão mental Lhe provocou “um suor como grandes gotas de sangue que caíram ao chão”.

Possivelmente, também, a tentação pode ter surgido a partir de uma sugestão de que Ele estava completamente abandonado. Eu não sei – pode haver sofrimentos mais severos do que este, mas certamente este é um dos piores, ser totalmente abandonado. “Veja,” disse Satanás, enquanto ele sussurrava isto entre seus dentes – “veja, Tu não tens um amigo em lugar algum! Olhe para o céu, Teu Pai calou as entranhas de Sua compaixão contra Ti. Nem um só anjo da corte de Teu Pai alongará sua mão para ajudar-Te. Vejas Tu adiante, nem um daqueles espíritos que honraram Teu nascimento interferirá para proteger a tua vi- da. Todo o céu é desleal a Ti; Tu és deixado sozinho.

E quanto a terra, não estão todos os homens sedentos do Teu sangue? Não ficarão satisfeitos os judeus ao ver Tua carne trans- passada pelos cravos, e não irá o romano regozijar-se quando Tu, o Rei dos Judeus, estiver preso à cruz? Tu não tens nenhum amigo entre as nações; o alto e o poderoso zombam de Ti, e o pobre move sua língua em escárnio. Tu não tinhas onde descansar a Tua cabeça quando estavas em Teu melhor estado; Tu não tens agora lugar aonde abrigo seja dado a Ti.

Veja as companhias com quem Tu tens tido doce segredo, de que eles servem? Filho de Maria, veja ali Teu irmão Tiago, veja ali Teu amado discípulo João, e teu valente Apóstolo Pedro – eles dormem, eles dormem; e acolá os oito, como covardes dormem quando Tu estás consumido em Teus sofrimentos! E onde estão os outros quatrocentos? Eles se esqueceram de Ti; eles estarão nas suas fazendas e comércios pela manhã. Oh! Tu não tens deixado nenhum amigo no céu ou na terra.

Todo o inferno está contra Ti. Eu tenho despertado a minha cova infernal. Eu enviei minhas cartas saídas de todas as regiões convocando todo príncipe das trevas para caírem sobre Ti esta noite, e nós não pouparemos nossas setas. Nós usaremos todo o nosso poder infernal para oprimir-Te, e o que farás, Tu que estás sozinho?” Esta pode ter sido, esta era a tentação; eu acredito que era, porque a aparição de um anjo junto a Ele, fortalecendo-O, removeu este temor. Ele foi ouvido quanto ao que temia, Ele não estava mais sozinho, mas o céu estava com Ele. Pode ser que esta seja a razão da sua ida três vezes aos seus discípulos – como Hart a expressa:

“Para trás e para frente, três vezes ele correu como se ele solicitasse algum auxílio humano.”

Ele veria por Si mesmo se era realmente verdade que todos os homens O haviam

abandonado; Ele encontrou todos adormecidos; mas talvez Ele recebeu algum pequeno consolo ao pensar que eles estavam dormindo, não por desleadade, mas por tristeza, o espírito, na verdade estava pronto, mas a carne era fraca.

Pensamos que Satanás atacou também o nosso Senhor com um escárnio realmente cruel. Você sabe em que disfarce o tentador pode vestir-se, e quão cruelmente sarcástica insinuação ele pode fazer – “Ah! Tu não serás capaz de efetivar a redenção do Teu povo. Tua sublime benevolência se demonstrará uma farsa, e Teus amados perecerão. Tu não prevalecerás para salvá-los do meu domínio. Tuas ovelhas dispersas certamente serão minhas presas.

Filho de Davi, eu sou equiparado a Ti, Tu não podes livrar-se da minha mão. Muitos de Teus escolhidos entraram no céu na força da Tua expiação, mas eu irei arrastá-los dali, e [vou] extinguir as estrelas da glória; eu irei diminuir os coristas de Deus nos átrios do céu, pois Tu não cumprirás a Tua fiança, Tu não podes fazê-lo. Tu não és capaz de levar ao alto todo este grande povo; eles ainda perecerão.

Veja, não são as ovelhas dispersas, agora que o Pastor está ferido? Eles todos se esquecerão de Ti. Tu nunca verás [fruto do] penoso trabalho de Tua alma. Teu desejado objetivo nunca será atingido. Tu serás para sempre o homem que começou a construir, mas não foi capaz de finalizar”. Talvez esta seja verdadeiramente o motivo pelo qual Cristo foi olhar por três vezes os seus discípulos. Vocês têm visto uma mãe, ela é muito fraca, fadigada com uma grave enfermidade, mas ela trabalha sob um pavor doloroso que seu filho venha a morrer. Ela se levanta de sua cama, na qual a doença a jogou, por um breve período de descanso.

Ela contempla ansiosamente a sua criança. Observa o mais fraco sinal de recuperação. Mas ela mesma está dolorosamente doente, e não pode aguentar mais que um instante fora de sua própria cama. Ela não consegue dormir, ela agita-se sofridamente, pois seus pensamentos vagueiam; ela se levanta para olhar novamente – “Como tu estás, filho meu, como tu estás? São aquelas palpitações do teu coração menos violentas? Está o teu pulso estabilizado? Mas, ai! Ela está fraca, e ela deve ir para a cama novamente, contudo ela não consegue descansar.

Ela retornará uma e outra vez para vigiar aquele a quem ama. Então, penso eu, Cristo olhou para Pedro, Tiago e João, como a dizer: “Não, eles não estão todos perdidos ainda, eles estão à [minha] esquerda e, olhando-os como protótipo de toda a Igreja, Ele parecia dizer: “Não, não, eu triunfarei ; eu terei o domínio, lutarei até o sangue; pagarei o preço do resgate, e libertarei os meus amados do seu inimigo”.

Agora, estas, penso eu, eram Suas tentações. Se vocês puderem formar uma ideia mais completa do que [Suas tentações] eram além destas, então ficarei satisfeito. Com esta única lição eu deixo este ponto – “Orem para que não entreis em tentação”. Esta é a própria expressão de Cristo; Sua própria dedução a partir de Sua aflição. Vocês todos têm lido, queridos amigos, a ilustração de John Bunyan da luta de Cristão contra Apolião.

Este mestre-pintor a esboçou de maneira bastante vívida. Ele diz, “esta furiosa luta prolongou-se até perto do meio-dia, hora em que se esgotaram as forças de Cristão, eu nunca o vi durante todo o tempo ter sequer um olhar de alegria, até perceber que havia ferido Apolião com a sua espada de dois gumes; então de fato, ele sorriu e olhou para o céu! Mas, esta foi a visão mais terrível que já vi”. Este é o significado desta oração, “Não nos deixe cair em tentação”. Oh, vocês que vão imprudentemente aonde são tentados, vocês que oram [pedindo] por aflições – e eu tenho conhecido alguns tolos o suficiente para fazerem isto – vocês que se colocam aonde tentam o maligno para os tentarem, prestem atenção ao exemplo do próprio Mestre. Ele suou grandes gotas de sangue quando foi tentado. Oh! Orem a Deus para poupá-los de tamanha aflição. Orem esta manhã e todos os dias, “Não nos deixe cair em tentação”.

III. Observem queridos irmãos, o SUOR SANGRENTO.

Nós lemos, que “Era o seu suor como grandes gotas de sangue”. Devido a isto, alguns escritores têm suposto que o suor não era realmente sangue, mas tendo apenas a aparência de sangue. Esta interpretação, entretanto, tem sido rejeitada pela maioria dos comentaristas, de Agostinho em diante, e é geralmente afirmado que a palavra “como” não apenas expressa semelhança com sangue, mas significa que era real e literalmente sangue.

Nós encontramos a mesma linguagem utilizada no texto: “Nós vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai”. Agora, claro, isso não quer dizer que Cristo era como o unigênito do Pai, já que ele realmente O é. Assim, geralmente, essa expressão da Sagrada Escritura apresenta, não uma mera semelhança com algo, mas a própria coisa em si. Acreditamos, assim, que Cristo realmente suou sangue.

Esse fenômeno, embora um tanto incomum, tem sido comprovado em outras pessoas. Há vários casos registrados, alguns em antigos livros de medicina de Galeno, e outros mais recentes, de pessoas que depois de prolongada fraqueza, sob medo da morte, têm suado sangue. Mas este caso é comple- tamente único em si mesmo, por várias razões. Se vocês observarem, Ele não apenas suou sangue, mas em grandes gotas; o sangue solidificou, e formou grandes coágulos. Eu não posso expressar melhor o que se entende pela palavra “gotas” – gotas grandes e pesadas.

Isso não foi visto em caso algum. Algumas pequenas efusões de sangue foram observadas em casos de pessoas que estavam previamente debilitadas, mas nunca grandes gotas. Quando se diz “que caíam ao chão”, isto mostra a sua copiosidade, de maneira que elas não somente estavam sobre a superfície e foram absorvidas pelas Suas vestes, até que Ele se tornasse como “novilha ruiva” [Números 19:2], que fora sacrificada naquele mesmo local, mas as gotas cairam ao chão.

Aqui Ele permanece inigualável. Ele era um homem com boa saúde, [tendo] apenas cerca de 30 anos de idade, e estava trabalhando sob nenhum medo da morte; mas a pressão mental decorrente de sua luta contra a tentação, e a tensão de toda a sua força, a fim de frustar a tentação de Satanás, teriam forçado seu

corpo à uma excitação sobrenatural, que seus poros expeliram grandes gotas de sangue, as quais caíam ao chão. Isso prova quão tremendo deve ter sido o peso do pecado quando foi capaz de esmagar o Salvador de forma que Ele destilou gotas de sangue! Isto demonstra, meus irmãos, o tremendo Poder de Seu Amor.

É uma linda observação a do velho Isaac Ambrose, de que a goma que exsuda da árvore que não é cortada é sempre a melhor. Esta preciosa alcanforeira produziu as mais doces especiarias quando foi ferida sob nodosos chicotes, e quando foi perfurada pelos pregos na cruz; mas vejam, ela produziu adiante seu melhor tempero quando não havia chicote, nem prego, nem ferida. Isto expõe o cárater voluntário dos sofrimentos de Cristo, desde que sem uma lança o sangue fluía livremente. Não havia necessidade de colocar a sanguessuga, ou aplicar a faca; [o sangue] flui espontaneamente.

Não havia necessidade de que os governantes clamassem “Brota, ó poço” de si mesmo fluem torrentes de cor carmesim [Números 21:17]. Queridíssimos amados amigos, se os homens sofrem alguma terrível dor de cabeça – eu não estou familiarizado com temas médicos – aparentemente o sangue corre para o coração. As bochechas ficam pálidas, desmaios ocorrem, o sangue flui ao interior, como para nutrir o homem interno, enquanto este passa por esta aflição.

Mas vejam o nosso Salvador em Sua agonia; Ele é tão completamente alheio de si mesmo, que, em vez de Sua agonia impulsionar Seu sangue para o coração, para nutrir-se, dirige- o para fora para orvalhar a terra. A agonia de Cristo, na medida em que O derrama sobre a terra, retrata a plenitude do sacrifício que Ele realizou pelos homens.

Vocês não percebem, meus irmãos, quão intensa deve ter sido a luta pela qual Ele passou, e não ouvirão a Sua voz para vocês? – “Vós ainda não resististes até o sangue, combatendo contra o pecado” [Hebreus 12:4]. Tem sido a porção de alguns de nós ter severas tentações – de outra maneira não saberíamos como ensinar outros – tão severas que na peleja contra elas, o suor frio e pegajoso brotou de nossas testas.

O lugar nunca será esquecido por mim – um local solitário; onde, meditando sobre o meu Deus, uma pressa terrível de blasfêmia cobriu minha alma, ao ponto de que eu preferia a morte a esta provação; e eu caí de joelhos ali e então, pois a agonia era horrível, enquanto minha mão estava sobre minha boca para evitar que as blasfêmias fossem faladas. Uma vez que Satanás seja permitido a realmente tentar você com a tentação de blasfêmia, e você nunca a esquecerá, mesmo que viva até que os seus cabelos tornem-se brancos; ou deixá-lo atacar vocês com um pouco de luxúria, ainda que vocês odeiem e detestem o simples pensamento disto, e [prefeririam] perder o seu braço direito a entregar-se a ela [à tentação], contudo, ele virá, os acusará, e perseguirá, e atormenta-los-á.

Pelejem contra isto até mesmo suar, meus irmãos, sim, até o sangue. Nenhum de vocês pode dizer, “Eu não pude evitá-lo; eu fui tentado”. Resistam até que vocês suem sangue ao invés de pecar. Não diga: “Eu estava tão pressionado por isto, e foi tão conformado ao meu temperamento natural que eu não podia deixar de cair [no pecado]”. Olhem para o grande Apóstolo e Sumo Sacerdote de sua profissão, e suem até o sangue ao invés de render-se ao grande tentador de suas almas. Orem que vós não entreis em tentação, para que quando entreis nela, vós possais, com confiança, dizer, “Senhor, eu não procurei por isto, por isso ajude-me a vencê-la, por causa do Teu nome”.

IV. Eu quero que vocês, em quarto lugar, observem A ORAÇÃO DO SALVADOR.

Queridos amigos, quando somos tentados e desejamos vencer, a melhor arma [que temos] é a oração. Quando você não pode usar a espada e o escudo, tome para si a famosa arma de Toda-oração. Assim fez o seu Salvador. Consideremos Sua oração. Era uma oração solitária. Ele afastou-se até mesmo de Seus três melhores amigos a uma distância de um tiro de pedra. Crente, especialmente em tentação, esteja mais em oração solitária. Assim como a oração pessoal é a chave para abrir o céu, também é a chave para fechar os portões do inferno. Assim como ela é um escudo para evitar, também é a espada usada para lutar contra a tentação. Oração familiar, oração social, oração na Igreja, não bastarão. Estas são muito preciosas, mas o melhor tempero forjado fumegará no seu incensário em suas devoções particulares, onde nenhum ouvido escuta, exceto Deus. Retirem-se à solidão, se vocês querem triunfar.

Observem, também, que foi uma oração humilde. Lucas disse que Ele ajoelhou-se, mas outro evangelista diz que Ele prostrou-se com o rosto em terra. O Quê! O Rei prostrou-se com o rosto em terra? Então, onde deve ser Teu lugar, Tu, humilde servo do grande Mestre? Acaso o Príncipe prostra-se rente ao chão? Onde, então, te prostrarás tu? Que pó e cinzas cobrirão tua cabeça? Que panos de sacos cingirão teus lombos? Humildade nos proporciona um ponto de apoio na oração. Não há esperança de alguma prevalência real com Deus, que abate ao soberbo, sem que nos humilhemos a nós mesmos para que Ele possa nos exaltar no tempo devido.

Além disto, esta foi uma oração filial. Mateus O descreve como dizendo “O, meu Pai,” e Marcos diz “Aba, Pai”. Vocês encontrarão constantemente uma fortaleza no dia da tribulação para pleitear sua adoção. Daí que a oração, na qual está escrito, “Não nos deixes cair em tentação, mas livrai-nos do mal,” começa com “Pai nosso, que estás no céu”. Peçam como uma criança. Vocês não têm direitos como súditos; Vocês os perderam por sua traição, mas nada pode confiscar o direito de uma criança à proteção de um pai. Não se envergonhem de dizer, “Meu Pai, ouça o meu clamor”.

Novamente, observem que esta era uma oração perseverante. Ele orou por três vezes, usando as mesmas palavras. Não se contentem até que vocês prevaleçam. Sejam como a

viúva insistente, cuja solicitação contínua obteve o que a sua primeira súplica não pôde ganhar. Continuem em oração, velando nas mesmas com ações de graças.

Além disso, vejam como brilhava com um calor incandescente – esta foi uma oração intensa. “Ele orou mais intensamente”. Que gemidos eram aqueles emitidos por Cristo! Que lágrimas, que brotaram da fonte profunda de Sua natureza! Façam orações intensas se vocês querem prevalecer contra o adversário.

E por último, aquela foi uma oração de renúncia. “Contudo, não seja como eu quero, mas sim como tu queres”. Cedam, e Deus cederá. Deixe ser conforme a vontade de Deus, e a Sua vontade será o melhor. Sê perfeitamente satisfeito em deixar o resultado de tua oração nas mãos dAquele que sabe quando, como, e o quê dar, e o quê reter. Assim suplicante, intensa e insistentemente, também misturando com humildade e resignação, tu prevalecerás.

Queridos amigos, nós devemos concluir, prosseguir ao último ponto tendo isto como uma lição prática – “Levantem e orem”. E se vocês estão em tentação, sejam mais do que nunca foram antes em suas vidas, urgentes, apaixonados, importunos com Deus, para que Ele os salve no dia de sua luta.

V. Como o nosso tempo se esgotou, nós concluímos com este último ponto, que é A PREVALÊNCIA DO SALVADOR.

A nuvem se foi. Cristo ajoelhou-se, e a oração é finalizada. “Mas”, diz alguém, “Cristo prevaleceu em oração?” Amados, poderíamos ter alguma esperança que Ele prevaleceria no céu se Ele não tivesse prevalecido na terra? Não poderíamos suspeitar que se Seu intenso clamor e lágrimas não houvessem sido ouvidos então, Ele poderia falhar agora? Suas orações apressaram-se, e, portanto, Ele é um bom intercessor para nós. “Como Ele foi ouvido?” A resposta será, de fato, dada brevemente. Ele foi ouvido, penso eu, em três aspectos.

A primeira resposta graciosa que foi dada a Ele foi, que Seu espírito foi subitamente acalmado. Que diferença há entre “Minha alma está profundamente triste,” – Sua pressa indo de um lado ao outro, Sua repetição por três vezes, em oração, a singular inquietação que estava sobre Ele – que contraste entre tudo isto e Sua ida ao encontro do traidor com [as palavras] “Com um beijo trais o Filho do homem?” Como um mar agitado antes, e agora tão calmo quanto quando Ele mesmo disse, “Aquiete-se! Acalme-se!” e as ondas se aquietaram [Marcos 4:39].

Vocês não conhecerão paz tão profunda quanto a que reinou no Salvador quando diante de Pilatos Ele não respondeu uma palavra sequer. Ele está calmo até o fim, tão calmo quanto se fosse o Seu dia de triunfo em vez de Seu dia de tribulação. Agora, penso eu, isto foi concedido a Ele em resposta à Sua oração. Ele teve sofrimentos talvez mais intensos, mas Seu espírito agora estava quieto como para enfrentá- los com maior determinação.

Como alguns homens, os quais quando inicialmente escutam os disparos em uma batalha são todos temerosos, mas à medida que a batalha cresce calorosa e eles estão em maior perigo, eles são tranquilos e têm domínio de si; eles estão feridos, estão sangrando, estão morrendo; mesmo assim eles estão calmos como a véspera de um verão; a onda inicial de tribulação se foi, e eles podem enfrentar o inimigo em paz – então, o Pai ouviu o clamor do Salvador, e soprou uma paz tão profunda em Sua alma, que foi como um rio, e Sua justiça como as ondas do mar.

Continuando, nós acreditamos que Ele foi atendido por Deus tê-Lo fortalecido através de um anjo. Nós não sabemos como isto ocorreu. Provavelmente, isto foi através do que o anjo disse, e igualmente provável é que isto foi pelo que ele fez. O anjo pode ter sussurrado as promessas; retratado diante de Seus olhos a glória de Seu êxito; esboçado Sua ressurreição; mostrou a cena de quando os Seus anjos levariam Seus carros desde ao alto para carregá-Lo ao Seu trono; recordou ante a Ele a memória do tempo de Seu advento, a perspectiva de quando Ele reinará de mar a mar, e do rio até os confins da terra; e então O fortaleceu.

Ou, talvez, por meio de algum método desconhecido, Deus enviou tal poder ao nosso Cristo, que se tornou como Sansão com seus cabelos tosquiados, que recebeu, subitamente, todo o poder e majestosa energia requerida para a terrível luta. Então, Ele andou para fora do jardim não mais como um verme, nem como homem, mas fortalecido com invisível poder que O tornou um digno combatente contra todos os exércitos que estavam ao seu redor. Uma tropa O subjugou, como Gade na antiguidade, mas Ele triunfou no final. Agora Ele pode entrar pelo meio de uma tropa; agora Ele pode saltar uma muralha [Salmo 18: 29]. Deus enviou força do alto pelo Seu anjo, e fez forte o Cristo homem para a batalha e para a vitória.

E acredito que podemos concluir dizendo que Deus O ouviu ao concedê-Lo agora, não apenas força, mas uma vitória real sobre Satanás.

Eu não sei se o que Adam Clarke supõe é correto, de que no jardim Cristo pagou a maior parte do preço em relação ao que Ele fez inclusive na cruz; mas, estou muito convencido de que são muito insensatos aqueles que atingem tal refinamento que pensam que a expiação foi realizada na cruz, e em mais em nenhum outro lugar. Nós acreditamos que a expiação foi feita tanto no jardim quanto na cruz; e parece-me que no jardim uma parte da obra de Cristo foi finalizada, completamente finalizada, e esta foi o Seu conflito com Satanás. Eu compreendo que agora, Cristo tem que suportar mais a falta da presença do Seu Pai e os ultrajes do povo e dos filhos dos homens, do que as tentações do maligno. Eu creio que estas foram finalizadas quando Ele levantou [depois de estar] de joelhos em oração, quando Ele elevou-se do chão onde marcou o Seu rosto na terra com gotas de sangue.

A tentação de Satanás havia, enfim, terminado, e Ele poderia ter dito em relação a esta parte da obra: “Está consumado; a cabeça do dragão é esmagada; Eu o venci”. Talvez nestas poucas horas que Cristo passou no jardim, toda a energia dos agentes da iniquidade foi concentrada e dissipada. Talvez, neste conflito, tudo o que a astúcia poderia inventar, tudo o que a malícia podia idealizar, tudo o que a prática infernal poderia sugerir, foi provado em Cristo, estando o Diabo livre de suas correntes para este propósito, tendo Cristo entregue a ele, como Jó o foi, para que ele pudesse tocá-lO em Seus ossos e em Sua carne, sim, tocá-lO em Seu coração e alma, e maltratar o Seu espírito.

Pode ser que cada Diabo no inferno e cada demônio do abismo foi convocado, cada um dar vazão ao seu próprio ódio e para derramar suas energias reunidas e malícia sobre a cabeça de Cristo. E ali Ele permaneceu, e Ele poderia ter dito, ao levantar-se, para enfrentar o próximo adversário, um demônio em forma humana, Judas: “Eu vim neste dia de Bozra, com vestes tintas de Edom; Eu pisei sobre os meus inimigos, e os venci de uma vez por todas; agora eu vou suportar os pecados dos homens e a Ira de meu Pai, e finalizar o trabalho que Ele deu-me a fazer” [Isaías 63:1]. Se assim foi, então Cristo foi ouvido em Seu temor reverente; Ele temia a tentação de Satanás, e foi livre dela; Ele temeu Sua própria fraqueza, e foi fortalecido; Ele temeu Sua própria inquietação mental, e foi acalmado.

O que poderemos dizer, então, em conclusão, senão esta lição. Não o disse “Tudo o que pedirdes em oração, crendo, o recebereis” [Mateus 21:22]. Então, se suas tentações alcançam as mais tremendas alturas e forças, continuem apegados a Deus em oração, e vocês prevalecerão. Pecador cuidadoso! Este é um consolo para você. Santo atribulado! Este é um regozijo para você. A lição desta manhã é para todos e para cada um de nós– “Orem para que não caiam em tentação”. Se estivermos em tentação, peçamos que Cristo ore por nós para que nossa fé não falhe, e quando passarmos pela tribulação, esforcemo-nos para fortalecer nossos irmãos, como Cristo nos fortaleceu neste dia.

Charles H. Spurgeon

Charles H. Spurgeon 011C. H. Spurgeon (1834-1892) era pregador, autor e editor britânico. Foi pastor do Tabernáculo Batista Metropolitano, em Londres, desde 1861 até a data de sua morte. Fundou um seminário, um orfanato e editou uma revista mensal chamada “Sword and Trowel”. Conhecido como “Príncipe dos Pregadores”, Spurgeon escreveu muitos livros e artigos, particularmente na área devocional.

* Sermão No 493. pregado na Manhã de Domingo, 8 de Fevereiro de 1863, por, no Tabernáculo Metropolitano, Newington. Fonte: Spurgeon.corg │ Título Original: Gethsemane

[Adaptado de The C. H. Spurgeon Collection, Version 1.0, Ages Software. Veja todos os 63 volumes de sermões CH Spurgeon em Inglês Moderno, e mais de 525 traduções em espanhol, acesse: www.spurgeongems.org

A Páscoa ” Getsêmani ” – Charles H. Spurgeon

Uma ideia sobre “A Páscoa ” Getsêmani ” – Charles H. Spurgeon

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